Tristeza - Fagundes Varela


Minh'alma é como o deserto
De dúbia areia coberto,
Batido pelo tufão;
como a rocha isolada,
Pelas espumas banhada,
— Dos mares na solidão. —

Nem uma luz de esperança,
Nem um sopro de bonança
Na fronte sinto passar!
Os invernos me despiram
E as ilusões que fugiram
Nunca mais hão de voltar!

Roem-me atrozes idéias,
A febre me queima as veias;
A vertigem me tortura!...
Oh! por Deus! quero dormir,
Deixem-me os braços abrir
Ao sono da sepultura!

Despem-se as matas frondosas,
Caem as flores mimosas
Da morte na palidez,
Tudo, tudo vai passando...
Mas eu pergunto chorando:
— Quando virá minha vez?

Vem, ó virgem descorada,
Com a fronte pálida ornada

De cipreste funerário,
Vem! oh! quero nos meus braços
Cerrar-te em meigos abraços
Sobre o leito mortuário!

Vem, ó morte! a turba imunda
Em sua miséria profunda
Te odeia, te calunia...
— Pobre noiva tão formosa
Que nos espera amorosa
No termo da romaria.

Quero morrer, que este mundo
Com seu sarcasmo profundo
Manchou-me de lodo e fel,
Porque meu seio gastou-se,
Meu talento evaporou-se
Dos martírios ao tropel!

Quero morrer: não é crime
O fardo que me comprime
Dos ombros lançar ao chão,
Do pó desprender-me rindo
E as asas brancas abrindo
Lançar-me pela amplidão!

Oh! quantas louras crianças
Coroadas de esperanças
Descem do campo à friez!...
Os vivos vão repousando;
Mas eu pergunto chorando:
— Quando virá minha vez? —

Minh'alma é triste, pendida,
Como a palmeira batida
Pela fúria do tufão.
É como a praia que alveja;
Como a planta que viceja
Nos muros de uma prisão!


(Fagundes Varela)

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