O paradoxo do avô — A ciência dos super-heróis (Trecho)

    Em "Even the Heir" [Até o herdeiro], publicada em Weird Science nº16, novembro-dezembro de 1952, o personagem principal, Seymour, mistura viagem no tempo e assassinato numa trama bizarra para ficar rico rapidamente. Como se trata de uma história da EC, as coisas não saem do modo como Seymour planejou, e no fim acaba literalmente sem nada. Contudo, a ideia da história nos fornece coisas de sobra para discussão.
    O paradoxo do avô é um dos temas mais populares da viagem no tempo da ficção científica. É também a única objeção à possibilidade de uma verdadeira viagem no tempo. E, estranhamente, a única resposta que parece atender ao dilema do paradoxo do avô está exatamente na ficção científica.
    Em termos mais simples, o paradoxo do avô pergunta: o que aconteceria se um homem construísse uma máquina do tempo, viajasse no passado e matasse seu avô antes de este se casar?
    A resposta mais simples, a utilizada em "Ever the Heir", é que esse homem deixaria de existir. Se ele voltasse no tempo e matasse seu avô antes de este se casar, então seu pai (ou mãe) não teria nascido. Não é preciso dizer que, sem seu pai ter nascido, ele também não teria. Ao matar seu avô, o assassino teria cometido suicídio — ou não?
    Se o nosso assassino matou seu avô antes de este se casar, o assassino nunca existiu. Se ele nunca existiu, como pode então fazer alguma coisa? Se não existiu significa que ele nunca fez nada, portanto seu avô não foi assassinado. Mas, se seu avô não foi assassinado e se casou, o nosso assassino nasceu, e seu avô foi assassinado.
    Em suma, construir uma máquina do tempo e viajar ao passado cria um paradoxo. Os paradoxos do tempo são bem irritantes, pois não têm uma solução simples. Nas mãos de um escritor e lógico habilidoso, os paradoxos do tempo são de enlouquecer. A que talvez seja a melhor a história de viagem no tempo já escrita, "All You Zombies", de Robert A. Heinlein, mostra uma personagem, Jane, que, através de desventuras no tempo, acaba se tornando igualmente seu próprio pai e sua mãe, bem como todos os demais personagens da história.
    Muitos cientistas acham que o paradoxo do avô e paradoxos de viagem no tempo semelhantes demonstram claramente que a viagem no tempo é impossível. Entretanto, há pelo menos uma teoria razoavelmente polêmica que afirma o contrário. Proposta em 1957 por Hugh Everett III e mais recentemente advogada por David Deutsch, essa teoria oferece uma alternativa simples aos paradoxos das viagens no tempo. É conhecida como a Interpretação dos Mundos Múltiplos da Mecânica Quântica.
    De acordo com a teoria de Everett, sempre que existem possibilidades múltiplas em eventos quânticos, o mundo (por "mundo" nos referimos a todo o universo) se divide em muitos mundos, um para cada possibilidade. Cada um desses mundos ou realidades é tão real quanto o original e existe simultaneamente com o primeiro, enquanto permanece inobservado por qualquer um dos outros.
    Em termos simples, a teoria dos mundos múltiplos argumenta que, para cada efeito possível de cada decisão já tomada, existe uma realidade alternativa. Essas realidades alternativas formam o que Everett chamou de multiverso. Por exemplo, enquanto lê este capítulo você pode resolver fazer um lanche. Procura no armário e encontra pipoca e batata frita. Pega a pipoca. Está é uma realidade. Ao mesmo tempo, outra realidade passa a existir, na qual, em vez da pipoca, você pegou a batata frita. Uma terceira realidade também é criada, na qual você pega tanto a pipoca quanto a batata. E, é desnecessário dizer, emerge uma quarta realidade, na qual você muda de ideia e decide não fazer uma boquinha.
    Numa escala maior, existe uma realidade na qual a Alemanha venceu a Segunda Guerra Mundial. Existe outra realidade na qual Hitler não nasceu. Existe uma realidade na qual os Estados Unidos nunca entraram na guerra. Existem realidades para qualquer ramificação da história, não importa se foi tomada uma pequena ou grande decisão. Com cada realidade se ramificando exatamente como a primeira, cada decisão tomada no mundo alternativo leva a mais mundos alternativos. O multiverso de Everett expande-se como os galhos de uma enorme árvore. É uma cosmologia na qual tudo que pode acontecer acontece em algum lugar.
    De que modo o multiverso de Everett se liga aos paradoxos da viagem no tempo? A teoria dos mundos múltiplos postula que sempre que um acontecimento é modificado, uma nova realidade é criada. Se um acontecimento passado é mudado por um viajante do tempo, não é criado nenhum paradoxo, pois o viajante se encontra numa nova realidade que seus atos acabaram de criar. Ele deixou sua realidade original e entrou numa nova.
    Por exemplo, no paradoxo do avô, um homem volta no tempo e mata seu avô. Numa realidade de mundo único, esse assassinato cria um paradoxo. Numa realidade de mundos múltiplos, uma nova realidade é criada pelo assassino. Esta se torna uma realidade na qual o assassino não nasceu. O nosso assassino passou de uma realidade para outra, uma realidade que ele criou. Se ele viajar para o ano do qual partiu, não encontrará vestígios de sua existência. Mas isso não importa, pois ele não veio realmente desse universo, mas de um alternativo. Ele fez com que a sua realidade se ramificasse e, portanto, não há paradoxo possível.
    A teoria dos mundos múltiplos é polêmica e não é aceita por muitos físicos. Nada dela, porém, contradiz qualquer uma das leis básicas do universo. No mínimo, os mundos múltiplos explicam alguns dos problemas mais incômodos que ainda existem na teoria quântica. Trata-se de uma ideia fascinante, principalmente porque tem sido o elemento principal da ficção científica desde que foi escrita a primeira história sobre universo paralelo em 1919. É também matéria-prima dos gibis de ficção científica. Talvez a melhor história de revistas em quadrinhos sobre mundo alternativo tenha sido publicada em Weird Fantasy nº20, de julho-agosto de 1953, intitulada "— For Us the Living" [ — Pór nós, os vivos]. Conta a história de um inocente turista do futuro que queria ver o maior estadista da história, mas, acidentalmente, desencadeia a série de acontecimentos que levam ao assassinato de Abraham Lincoln. É uma perfeita demonstração de como até mesmo as melhores intenções podem causar terríveis resultados quando combinadas com viagem no tempo e realidades alternativas.
     A narrativa serve, principalmente, como um perfeito exemplo de como ciência e ficção científica, personagens e trama, juntamente com um excelente desenho e um senso de estilo podem contar uma ótima história de modo divertido, que é o papel dos gibis.

Capítulo retirado do livro: A ciência dos super-heróis (de Lois Gresh e Robert Weinberg).
Capítulo 10/ Mistérios no espaço: super-heróis da ficção científica/ O paradoxo do avô/ Página 180.

Ler romance altera seu cérebro

 

    Altera para melhor, claro. Ler faz com que seu cérebro fique mais ágil na arte de compreensão do texto e ainda te transporta para dentro do corpo do protagonista. Transporta de verdade, biologicamente, como se você estivesse nadando, correndo ou fugindo.
    Para descobrir, os pesquisadores da Universidade Emory convidaram 19 voluntários para o teste. Durante cinco dias, eles escanearam o cérebro de todos. A partir do sexto dia, os participantes começaram a leitura de Pompeii, de Robert Harris. Ao longo de nove dias todos tinham de ler 30 páginas por noite — e eles eram cobrados: para provar que liam mesmo, respondiam diariamente a questionários sobre a obra do autor inglês. E, todas as manhãs, eles tinham de ir até o laboratório para tirar imagens do cérebro. Ao fim do período de leitura, os cientistas ainda pediram a eles para que voltassem por mais cinco dias, para escanear outra vez o cérebro.
    Bem, a maratona de exames de ressonância magnética serviu para mostrar o que acontece no cérebro de quem lê. Há um aumento entre as conexões no córtex temporal esquerdo, associado à capacidade de compreensão da linguagem, Mudanças em outras conexões sugerem ainda que o cérebro do leitor, durante um pensamento sobre a ação (durante ou após a leitura de um trecho), imite essa conectividade, como se a ação real. Ou seja, o simples fato de pensar em nadar, correr, ou pular pode desencadear as mesmas conexões neurológicas que uma atividade física.
    "As alterações neuronais que descobrimos associadas com a sensação física e os sistemas de movimento sugerem que ler um romance pode transportar você para o corpo do protagonista", explica Gregory Berns, um dos autores da pesquisa. "Nós já sabíamos que boas histórias podiam colocar você no corpo de alguém, no sentido figurado. Agora estamos vendo que alguma coisa pode estar acontecendo biologicamente".
    Os pesquisadores só não sabem dizer por quanto tempo, após o fim da leitura, esse efeitos permanecem. Pra não perder nada, melhor, então, ler um livro atrás do outro.


Fonte: Super Interessante - Ciência maluca - Carol Castro